Como fica direito do empregado se Bolsonaro extinguir Justiça do Trabalho?

O presidente recém-empossado Jair Bolsonaro afirmou em entrevista na quinta-feira (3), ao canal de televisão SBT, que a extinção da Justiça do Trabalho é uma questão a ser debatida em seu governo. “Qual país que tem [Justiça do Trabalho]? Tem de ter a Justiça comum”, afirmou Bolsonaro, fazendo referência aos altos números de processos trabalhistas registrados no Brasil.

Como ficaria a defesa dos trabalhadores se esses tribunais específicos deixarem de existir?

Juristas e advogados afirmam que, sem muitos detalhes além da breve declaração do presidente, os futuros caminhos a serem percorridos pelo trabalhador dentro da Justiça ficam indefinidos, e, em última instância, abrir um processo contra a empresa ou empregador ficaria ainda mais caro e difícil.

“Há muitas perguntas que ficam por ser respondidas”, disse o advogado especializado em direito do trabalho Ericson Crivelli, sócio do Crivelli Advogados. “Que Justiça vai receber isso? A estadual? A federal? Haverá câmaras especializadas se for para a Justiça comum? Tudo isso teria que ser detalhado e regulamentado”, afirmou Crivelli, que também já foi consultor da OIT (Organização Internacional do Trabalho).

“O desmonte da Justiça especializada só traz desvantagens para o trabalhador”, afirmou Marcus Orione, professor de direito do trabalho e seguridade social da Faculdade de Direito da USP (Universidade de São Paulo).

“Ir para a Justiça comum significa levar essas causas de juízes especializados para profissionais que julgam outros assuntos, como tributação, previdência ou divórcio, e isso desprotege o trabalhador.”

Mais custos para o trabalhador
Outra diferença entre a Justiça do Trabalho e a comum está na necessidade de o reclamante –no caso, o trabalhador– pagar as custas do processo e de honorários dos advogados da outra parte, caso perca a ação.

Até a reforma trabalhista, em vigor desde final de 2017, os trabalhadores tinham a garantia da gratuidade desses serviços. Esse direito foi retirado pela nova legislação, mas depende ainda de decisões pendentes no STF (Supremo Tribunal Federal), que deve julgar se a exigência desses custos seria um limitador de acesso à Justiça para o trabalhador, o que faria dela inconstitucional.

Justiça especial existe em vários países
Os Estados Unidos, principal referência daqueles que defendem tribunais unificados para as diferentes causas, são um exemplo de país onde as questões trabalhistas vão para a Justiça comum, mas não é regra.

“Há vários países que usam a Justiça comum [para causas trabalhistas], mas há vários outros também com varas especiais para as relações trabalhistas”, disse Crivelli, mencionando exemplos como Alemanha, França, Espanha e Argentina.

Tribunais exclusivos para a área, como é no Brasil, ou varas e comissões especiais dentro da Justiça geral são alguns dos formatos comuns nos países onde as relações entre empregados e empregadores têm tratamento separado.

Outro formato existente é haver tribunais especiais trabalhistas para os julgamentos em primeira instância (papel cumprido no Brasil pelas varas regionais do Trabalho). Da segunda instância em diante, isso passa para repartições da Justiça comum, similares aos nossos STF e o STJ (Supremo Tribunal de Justiça).

No Brasil, também os recursos em segunda e terceira instâncias têm direito a órgãos e juízes exclusivos na área trabalhista, papel cumprido pelos TRTs (Tribunais Regionais do Trabalho) e o TST (Tribunal Superior do Trabalho).